
TRANSTORNO DEPRESSIVO PERSISTENTE - DISTIMIA
Por Denise Maia
Pouco conhecida como termo técnico, a distimia é uma forma sintomatológica branda, porém crônica, de depressão, não-episódica. Devido aos sintomas serem menos alarmantes, há cronicidade e a ausência do reconhecimento da doença trazem prejuízos muitas vezes maiores do que a própria depressão.
Sua origem (etiologia) é multifatorial e complexa, envolve fatores biológicos e psicológicos, hereditariedade, predisposição, temperamento, momentos da vida, estressores, gênero, etc.
O Transtorno Psiquiátrico Crônico ou Depressivo Permanente (TDP), a distimia pode vir desde a infância e se estender por toda a vida, prejudicando bastante a qualidade de vida de quem a possui e a dos que estão ao seu redor. Eventos de vida estressantes e mal resolvidos ocorridos na infância ou adolescência são relatos relevantes. Muitos ignoram a doença por considerar que a característica faz parte da sua personalidade - o que dificulta muito a sua aceitação e a iniciativa na busca de tratamento.
Desde a Grécia Antiga a doença já fora identificada, cujo termo distimia significa em grego “mau humor”. Na Idade Média passou a ser tratada como doença mental pelos cléricos que muito atribuía à magia e possessões. No mundo árabe outros estudiosos avançaram no conceito de releituras clínicas e sobre a melancolia (980 a 1087). No Renascimento (1621) Robert Burton lista em “ A anatomia da melancolia” suas causas como idade avançada, temperamento e hereditariedade e a conclui como causa secundária de doenças do corpo. Willian Cullen (1710-1790), no Iluminismo, “associa a melancolia a uma instabilidade primária do cérebro e sugere "restrições" como o melhor remédio para diminuir a excitação.”
Foi no século IXX que Falret (1824-1902) percebeu-a como um continuum com doenças maiores. Descreve-a como uma forma atenuada da doença circular. Karl Ludwig Kahlbaum (1863) usa “ciclotimia” para as formas leves de flutuação do humor e “distimia” para as formas da doença (melancolia) pois apresentam apenas uma fase de depressão branda. Este conceito mais se aproxima do termo no sentido de depressão crônica leve e não a um temperamento psicopático depressivo.
Em 1860 o termo “depressão” ganha status na medicina. O uso do termo melancolia foi suplantando em função da impressão fisiológica e metafórica de queda das funções que sugeria.
Emil Kraepelin (1921) co-relaciona o temperamento depressivo e a insanidade maníaco-depressiva como sendo a primeira uma forma atenuada mas que pertence ao mesmo continuum patológico da mais grave. Suas características de temperamento depressivo e flutuante, tristeza, ansiedade, pessimismo e falta de prazer. Defendeu a classificação de doença mental baseada na história dos pacientes e no curso evolutivo dos transtornos e seus sintomas psiquiátricos. Deu um status nosológico à doença e agrupou os transtornos de humor como insanidade maníaco-depressiva diferenciando da demência precoce (esquizofrenia).
Em 1923, Kurt Schneider descreve a psicopatia depressiva ou distímica, como a “combinação etiológica de fatores hereditários, neonatais e a influências ambientais precoces — e não a uma doença do humor (depressiva)”. Definiu-a como personalidades anormais de variantes constitucionais do normal, considerando-a uma psicopatia depressiva no campo dos transtornos de personalidade.
Houve inovação com Kretschmer (1936) que apesar de aderir ao conceito de continnum entre o temperamento básico e a doença, se opôs ao conceito da unidade nosológica indicada por Kraepelin e criou um diagnóstico dimensional.
Em 1968, pelos órgãos competentes, determinou-se que a depressão crônica seria equivalente às neuroses de caráter, e foi desvinculada dos transtornos do humor, ligando-a a transtornos de personalidade. Na década de 60 e 70, a "Depressão Neurótica", e "Neurose Depressiva", englobavam episódios não-crônicos.
A problemática conceitual de que os transtornos de personalidade não eram tratáveis agravou-se pelo fato de que a existência de personalidades normais com traços anormais variantes não seria um transtorno psiquiátrico a princípio.
Com a publicação de estudo - 1978, Akiskal et al. – durante 3 a 4 anos de casos clínicos de 100 neuróticos depressivos que não apresentavam sinais relevantes para o diagnóstico de depressão neurótica. Foi o que evidenciou os mais variados diagnósticos nosológicos de tantas outras modalidades de transtorno de humor quanto de outras patologias. Ficou concluído que o diagnóstico de depressão neurótica não possuía características fenomenológicas suficientes para se considerar uma entidade nosológica própria. Isso foi um marco para a definição nosológica dos transtornos de humor, suporte atual das bases empíricas da distimia.
O percentual da doença atinge cerca de 3% da população. Pacientes geralmente não procuram ajuda e suportam por um longo período seus sintomas. Queixas mal definidas, como mal-estar, letargia e fadiga dificultam o diagnóstico. O que leva a maior cormobidades (50%).
A distimia, também chamada de doença do mau humor, é um tipo de depressão crônica onde o indivíduo apresenta sintomas de depressão leve na maior parte dos dias por pelo menos 2 anos, sendo que dificilmente o indivíduo sabe dizer o que o levou a este estado depressivo.
São considerados características em pacientes com transtorno distímico: atitudes sarcásticas, niilistas (descrentes de tudo), rabugentos, exigentes e queixosos. Geralmente são tensos, rígidos e resistentes às intervenções terapêuticas mas presentes às sessões. A vida social é relativamente estável. Investem mais energia no trabalho negligenciando o lazer e o convívio familiar e conjugal o que gera conflitos.
São sinais e sintomas de distimia para critério de diagnóstico:
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Mau humor frequente - humor deprimido a maior parte do dia por período de 2 anos;
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Em crianças e adolescentes o humor pode ser irritável com duração mínima de 2 anos;
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Excesso de críticas;
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Angústia;
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Ansiedade;
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Inquietação;
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Insatisfação;
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Irritabilidade;
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Falta de apetite ou apetite em excesso;
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Falta de energia ou fadiga;
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Sentimento de falta de esperança;
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Isolamento social.
Má digestão, dor muscular, dor de cabeça e má circulação, o indivíduo muitas vezes queixa-se de não estar feliz, mas também não está triste, também ocorrem.
”A Distimia foi classificada no DSM-V como Transtorno Depressivo Persistente para representar uma junção do Transtorno Depressivo Maior Crônico e do Transtorno Distímico anteriormente definidos no DSM-IV. O DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) é o principal guia para profissionais da área da saúde mental, e possui critérios utilizados para o diagnóstico e classificação dos estados depressivos. A atual nosografia oficial classifica a distimia como um transtorno de humor, diferenciando-se do TDM por ser crônica e menos severa”.
Vários estudos vem contribuindo para uma melhor apreciação da doença. Estudos sobre TDM, DD, transtorno bipolar, novas terminologias como “psiquiatria liminar” vem tentando iluminar cada nuance da doença e seus subtipos investigando a aplicação de critérios diagnósticos para categorias liminares (TDM e distimia) e subliminares de depressão. Critérios sobre personalidade, sintomas, estímulos cognitivos e emocionais, sintomas vegetativos e psicomotores e a busca de um continuum ou não da etiologia da doença e seus vários níveis uma vez que alguns transtornos fogem do padrão de critérios diagnósticos contemporâneos trazendo níveis de sofrimento subjetivo e incapacitações substanciais, salientando a importância da "psiquiatria subliminar".
Observações sistemáticas de casos revelam mudanças substanciais nos subtipos de depressão com o passar do tempo. A superposição de uma classificação diagnóstica categorial sobre uma de traço continuamente em mudança pode levar a um sistema diagnóstico que falha em representar adequadamente o espectro depressivo subjacente. Esses estudos revelam a existência do espectro depressivo e reforçam o conceito de que algumas depressões subliminares fazem parte do mesmo espectro. Tal como sintomas da bipolaridade como astenia, letargia e baixa energia caracterizam um subgrupo de distímicos. A descrição de subtipos ansioso e anérgicos de distímicos podem progredir para a bipolaridade, o que sugere uma conceitualização mais complexa da distimia dentro do espectro afetivo da bipolaridade o “transtorno bipolar menor”.
“Os dados do eletroencefalograma (EEG) durante o sono e as anormalidades nos testes de TRH-TSH, entre outros, indicam que muitas pessoas com transtorno distímico exibem, como linha basal, os padrões neurofisiológicos encontrados no TDM agudo, confirmando ainda mais a natureza constitucional do transtorno”.
Todos esses estudos sobre a distimia carecem de uma maior padronização metodológica. Estudos clínicos relataram limitações metodológicas, o que dificulta a generalização resultados como diagnósticos na adoção de um conceito padrão de transtorno distímico. E são de suma importância para o avanço do tratamento. É fato que a distimia é uma porta para várias comorbidades e quanto mais rápido seu diagnóstico menos custos tanto para o paciente quanto para a Saúde Pública.
As próprias classificações oficiais (CID-10 e DSM-IV) têm diferentes critérios diagnósticos. De qualquer forma aos poucos a distimia vem sendo reestruturada com estudos mais criteriosos e conceitos padronizados.
A despeito das diferenças entre os critérios do DSM-IV e da CID-10 para início precoce e tardio do transtorno distímico e das controvérsias quanto à relevância dessa distinção, essa classificação é bem aceita.
O tratamento se dá com a combinação de psicoterapia e antidepressivos que aliviam os sintomas e tratam os neurotransmissores que comandam o humor, como o sistema límbico, o hipotálamo e o lobo frontal. Restabelecendo o equilíbrio da serotonina e noradrenalina. Por causa do problema, muitos se isolam, usam álcool e outras drogas, enquanto poderiam estar bem se fizessem o uso combinado de medicamentos e psicoterapia.
As sessões de psicanálise são de grande ajuda no tratamento. A terapia cognitiva comportamental ajuda o indivíduo a encontrar as raízes da depressão e assim estruturar uma resposta emocional para cada situação bem como caso a caso.
Cabe concluir que um bom psicanalista deve seguir sua sensibilidade, perspicácia, o bom senso, a inteligência, a dedicação, estudos em áreas afins e e a boa e eficaz atenção flutuante; são os caminhos para uma psicanálise que busca o bem do paciente e não as descobertas de soluções supostamente inovadoras que tentam unir nuances infindáveis dos sintomas ou definir linhas limítrofes entre elas sob conceitos, definições características e classificações, escolas e tendências, tipos e subtipos, as quais de nada ajudam o paciente a não ser a vaidade dos inovadores! Afinal para o paciente não há diferença dizer que seu diagnóstico não é uma doença e sim um transtorno uma vez que tal anúncio não será causa para sua cura! Excesso de tabelas descritivas de sintomas e discussões híbridas sobre colocar o “ponto ou vírgula” mais atrapalham do que solucionam as questões clínicas. Labirintos que chegam a conceitos híbridos de frutos não colhidos e a exagerada substantivação e adjetivações de termos “técnicos-médicos” só abrem um leque mais confuso do que didático e prático aos profissionais da área!
Fontes de consultas:
1 - Fonte: Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul
2 – site Scielo.br – Revista de Psiquiatria do RG – artigos: Distimia. Do mau humor ao mal do humor diagnóstico e tratamento; Distimia: características históricas e nosológicas e sua relação com o transtorno depressivo maior.
3 – site: A Musa de Freud – artigo: Transtorno Depressivo Persistente – Distimia
4 – site; Qualidade de Vida, artigo: “Saiba mais sobre distimia ...”